Como você analisa essas manifestações que vêm ocorrendo há
uma semana em todo o Brasil?
De um dia para o outro a mídia comercial, que condenava o "vandalismo" das manifestações, passou a apoiar e até mesmo incentivar os protestos nas ruas. O que está por trás da mudança de atitude da mídia?
Nota-se um movimento forte contra a Rede Globo nas
manifestações. Você acha que é um reflexo do poder das redes sociais?
A cada dia surge um nacionalismo mais forte nos protestos e nas redes sociais também. o que te parece esse fenômeno?
Há uma perseguição clara, em várias cidades, contra militantes de partidos políticos. O que isso representa?
Quais os desafios da esquerda partidária nesse momento?
Qual pode ser o impacto eleitoral dessas manifestações?
Há alguns setores pedindo impeachment da presidenta Dilma. Você acha que isso pode crescer?
As manifestações mostram que existe
uma enorme insatisfação social e uma imensa vontade de participação política
represada. Como em outros momentos na história, esta insatisfação/vontade
emergiu de forma basicamente espontânea, atropelando todos os partidos e
movimentos sociais, inclusive o próprio Movimento Passe Livre. Como é natural
em qualquer movimento de massas, há de tudo, social e politicamente falando.
Mas o sentido principal do movimento é por mudanças mais radicais e mais
rápidas no Brasil. Claro que a direita política e os meios de comunicação
operam para capturar o movimento e direcioná-lo num sentido específico: a
mudança de governo em 2014. Cabe a nós, da esquerda, especialmente ao PT,
cooperar com o movimento noutro sentido: o de ser um instrumento para alterar a
correlação de forças no Brasil.
De um dia para o outro a mídia comercial, que condenava o "vandalismo" das manifestações, passou a apoiar e até mesmo incentivar os protestos nas ruas. O que está por trás da mudança de atitude da mídia?
A máxima: se você não pode vencê-los,
una-se a eles. Foi o que parte da direita e do PIG fizeram: tentar capturar o
movimento e direcioná-lo num sentido específico: derrotar o PT e o governo
Dilma. Não tiveram êxito, mas poderiam ter tido. O que nos salvou foi a
sensibilidade social majoritária na base do PT e em importantes segmentos de nossa
direção. Infelizmente, alguns setores não entenderam a mensagem das ruas. É o
caso do ministro Cardozo, que num primeiro momento chegou a falar em oferecer a
ajuda de tropas federais para enfrentar as manifestações. E é o caso, também,
do prefeito Haddad, que demorou para entender que era preciso revogar o aumento
e, quando finalmente tomou a decisão, a anunciou na pior companhia possível.
Não acho que os meios tenham poder em
si. As redes sociais, por exemplo, foram inundadas nos últimos dias por perfis
de direita. Aliás, a direita tem know-how e dinheiro para ocupar de maneira
profissional as redes sociais, com suas palavras de ordem, algumas vezes
neutralizando a presença de ativistas de esquerda. O fundamental é que existe
uma consciência democrática em setores de massa, motivo pelo qual, por exemplo,
a reação à repressão da PM de Alckmin foi tão ampla e generalizada. É esta
consciência democrática de massas que explica o repúdio à Globo e a outros
meios de comunicação. As "pessoas comuns" sabem pensar e não querem
que pensem por elas.
A cada dia surge um nacionalismo mais forte nos protestos e nas redes sociais também. o que te parece esse fenômeno?
Aí há fenômenos diferentes
misturados. Primeiro, um movimento social de massas espontâneo não tem ainda
seus próprios símbolos, por isso usa e reinventa os que têm nas mãos. No caso,
os mais óbvios são a bandeira, o hino, o nome do país etc. Em segundo lugar, um
setor importante da esquerda brasileira passou a valorizar a defesa da
soberania nacional, inclusive por conta da situação internacional. Em terceiro
lugar, existe a direita, que não é nacionalista de verdade, mas que usa o
nacionalismo como biombo para ocultar seus verdadeiros propósitos e, de
passagem, tentar atacar a esquerda como alienígena. Por estes diferentes
motivos, é normal que neste estágio do movimento, a temática nacionalista seja
tão forte.
Há uma perseguição clara, em várias cidades, contra militantes de partidos políticos. O que isso representa?
Representa uma mistura de
despolitização de direita, com um legítimo cansaço das pessoas em relação a
política tradicional. E é potencializado pelo distanciamento entre os partidos
políticos de esquerda e a vida cotidiana da população. No caso do PT, é um
alerta: ou mudamos de política e de conduta, ou parcelas crescentes da
população vão nos jogar na vala comum.
Quais os desafios da esquerda partidária nesse momento?
Mudar de política e mudar de conduta.
As manifestações mostraram que existe espaço para mobilizar a sociedade em
defesa de reformas estruturais mais profundas. E mostraram, também, que se a
esquerda que está no governo não se apoiar nesta mobilização, para mudar o país
mais rápido e profundamente, quem vai crescer é a direita, não a esquerda
oposicionista. Mas para se apoiar nesta disposição de luta que existe na
sociedade, é preciso voltar ao povo, organizar o povo, estar disposto a
conviver com as contradições de um movimento social de massas com novos
personagens e, principalmente, que atua num contexto novo: em que a esquerda
está nas ruas e também nos governos.
Qual pode ser o impacto eleitoral dessas manifestações?
Depende do nosso comportamento no PT.
Se nós do PT tivermos sensibilidade social e ativismo político, estas
manifestações e as que virão ajudarão o país a mudar mais rápido, nos ajudarão
a vencer a direita em 2014 e nos ajudarão a fazer um segundo mandato Dilma melhor
do que o primeiro. Se nos faltar sensibilidade e ativismo, pode ocorrer como na
Espanha, em que o povo ocupou as ruas e a direita ocupou as urnas.
Há alguns setores pedindo impeachment da presidenta Dilma. Você acha que isso pode crescer?
Não. A reação da Dilma, do Lula, das
instâncias de base do PT e, embora tardia, a nota da direção nacional do PT não
abrem espaço para isto. Claro que setores da direita vão falar nisto, mas o
objetivo real é tentar nos desgastar tendo em vista 2014.
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Valter Pomar é historiador formado pela Universidade de São Paulo,
doutor em História Econômica e gráfico formado pelo Senai. Foi secretário de
Cultura, Esportes, Lazer e Turismo da Prefeitura de Campinas de 2001 a 2004.
Integra a direção nacional do Partido dos Trabalhadores desde 1997 e atualmente
é secretário de Relações Internacionais do Partido.
F. J. O. A.
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