Como se cria
uma cultura? Existe um caso bastante compartilhado no meio gerencial que trata
de um grupo de macacos posto em uma jaula por cientistas. No cativeiro, foi
colocada uma escada com uma banana em cima. Se um dos animais tentasse subir
para pegar a fruta, os outros, embaixo, levavam choque elétrico. Por fim,
quando um deles se atrevia na escalada, os demais se antecipavam e o espancavam
para evitar o castigo.
Depois, os cientistas foram substituindo um a um os macacos. O novato tentou subir a escada, é claro, mas apanhou dos veteranos. Trocou-se um segundo animal, que também tentou pegar a banana. Mas foi igualmente impedido a pancadas pelos outros, inclusive pelo que havia entrado na jaula por último. Assim, todos foram substituídos, e, apesar de nenhum do novo grupo ter sofrido choques, aprenderam que não era bom tentar pegar a banana.
Na gestão pública brasileira, aparentemente, é mais ou menos assim. Só que, em vez de responder ao estímulo do medo, o que move nossos gestores é a mamata. As tais prerrogativas de função de desembargador, procurador, ministro, parlamentar etc. preservam o abismo que distingue os gabinetes do resto da sociedade. Em vez da jaula dos macacos, é uma redoma de vidro blindado.
O que explica o fato de as ruas do país pegarem fogo e um deputado, um senador ou um ministro fretar um avião da Força Aérea Brasileira para levar a família a um jogo da seleção brasileira? É só desfaçatez e cara de pau regimental? Os protestos levaram milhões de brasileiros a reivindicarem mais moralidade na condução da administração coletiva. Nos Legislativos, os nobres até que aprovaram medidas que acarretam mudanças positivas profundas. Contudo, as práticas individuais na investidura dos cargos se mostraram imunes aos apelos. Foi tudo da boca, ou melhor, do plenário pra fora?
TUDO CONTINUA IGUAL
Os gastos com diárias nos Poderes continuaram escorchantes na visão de quem tira do próprio salário para pagar a gasolina. Os deputados foram passear em destinos litorâneos em janeiro, quando não trabalham. As passagens eles penduraram nos ombros de todos nós, que precisamos dividir as viagens de férias em 12 vezes no cartão. Agora, vem a informação de que senadores vivem o bom e o melhor a nossas custas. Quem nos dera tamanha mordomia. Como pode? Uma dessas autoridades que usaram jatinho da FAB disse que se recusava a ressarcir a União porque tem direito à regalia.
É até de se supor que esses cavalheiros tenham alguma noção da distância entre a dimensão que habitam e a realidade da maioria dos trabalhadores. Mas o buraco é mais embaixo: trata-se de um vício cultural que remonta a 1808 e ao séquito transatlântico de d. João VI. Quando esse pessoal privilegiado sentou-se na cadeira, o dono da bunda que a esquentou anteriormente também recebia as mesmas benesses, e o predecessor desse também. A prática recorrente, passada a cada nomeação, se transforma em cultura com o tempo, e, por isso, o problema se complica.
Não adianta nada irmos trocando os macacos de quatro em quatro anos se a prática introjetada da mamata não for reformada também nos plenários, gabinetes, carros oficiais e afins. Se não há bananas para todos, é melhor que ninguém tenha acesso a elas.
(transcrito de O Tempo)
Depois, os cientistas foram substituindo um a um os macacos. O novato tentou subir a escada, é claro, mas apanhou dos veteranos. Trocou-se um segundo animal, que também tentou pegar a banana. Mas foi igualmente impedido a pancadas pelos outros, inclusive pelo que havia entrado na jaula por último. Assim, todos foram substituídos, e, apesar de nenhum do novo grupo ter sofrido choques, aprenderam que não era bom tentar pegar a banana.
Na gestão pública brasileira, aparentemente, é mais ou menos assim. Só que, em vez de responder ao estímulo do medo, o que move nossos gestores é a mamata. As tais prerrogativas de função de desembargador, procurador, ministro, parlamentar etc. preservam o abismo que distingue os gabinetes do resto da sociedade. Em vez da jaula dos macacos, é uma redoma de vidro blindado.
O que explica o fato de as ruas do país pegarem fogo e um deputado, um senador ou um ministro fretar um avião da Força Aérea Brasileira para levar a família a um jogo da seleção brasileira? É só desfaçatez e cara de pau regimental? Os protestos levaram milhões de brasileiros a reivindicarem mais moralidade na condução da administração coletiva. Nos Legislativos, os nobres até que aprovaram medidas que acarretam mudanças positivas profundas. Contudo, as práticas individuais na investidura dos cargos se mostraram imunes aos apelos. Foi tudo da boca, ou melhor, do plenário pra fora?
TUDO CONTINUA IGUAL
Os gastos com diárias nos Poderes continuaram escorchantes na visão de quem tira do próprio salário para pagar a gasolina. Os deputados foram passear em destinos litorâneos em janeiro, quando não trabalham. As passagens eles penduraram nos ombros de todos nós, que precisamos dividir as viagens de férias em 12 vezes no cartão. Agora, vem a informação de que senadores vivem o bom e o melhor a nossas custas. Quem nos dera tamanha mordomia. Como pode? Uma dessas autoridades que usaram jatinho da FAB disse que se recusava a ressarcir a União porque tem direito à regalia.
É até de se supor que esses cavalheiros tenham alguma noção da distância entre a dimensão que habitam e a realidade da maioria dos trabalhadores. Mas o buraco é mais embaixo: trata-se de um vício cultural que remonta a 1808 e ao séquito transatlântico de d. João VI. Quando esse pessoal privilegiado sentou-se na cadeira, o dono da bunda que a esquentou anteriormente também recebia as mesmas benesses, e o predecessor desse também. A prática recorrente, passada a cada nomeação, se transforma em cultura com o tempo, e, por isso, o problema se complica.
Não adianta nada irmos trocando os macacos de quatro em quatro anos se a prática introjetada da mamata não for reformada também nos plenários, gabinetes, carros oficiais e afins. Se não há bananas para todos, é melhor que ninguém tenha acesso a elas.
João Gualberto Jr.
(transcrito de O Tempo)
Sem comentários:
Enviar um comentário