Número total de visualizações de páginas

domingo, 31 de março de 2013

Chiprússia - A ilha paraíso dos oligarcas


Como a ilha de Chipre se tornou numa máquina de lavagem e dinheiro e fuga fiscal para os oligarcas russos - e faz com que a Zona Euro, com a Alemanha à cabeça, arrisque uma guerra comercial com Moscovo 
Não é de hoje a ligação de Chipre aos negócios duvidosos envolvendo a indústria da banca e da alta finança. Foi em 1992 que o carniceiro sérvio Slobodan Milosevic começou a desviar o dinheiro - mais de 800 milhões de dólares - que contava lhe servisse de almofada para a reforma e para negócios de armas duvidosos e que acabou a bordo de um avião de carga com destino a Larnaca, no centro-sul do país.

Porquê? Porque, segundo os relatos da época, a ilha era já um "porto de entrada" de dinheiro negro no resto do mundo. Aqui e na sua "irmã" Grécia, segundo a documentação constante do processo em Haia contra Milosevic, foram criadas oito empresas-fantasma - uma das quais registada em nome de Tassos Papadopoulos, que viria a ser Presidente da República grega, de 2003 a 2008, - e 350 contas bancárias fictícias. Estas serviriam para transferir capital para outros paraísos fiscais mais recomendáveis e estabelecidos: Suíça, Mónaco e Liechtenstein.  

A União Soviética tinha caído um ano antes (1991), oportunistas fazem fortuna, à custa dos despojos do Estado. Começam a circular, em Chipre, eslavos e russos endinheirados. Generais, traficantes de armas e drogas, oligarcas e toda a espécie de novos-ricos chegam em aviões privados, deslocam-se de limusina e chofer e apresentam-se à porta dos bancos com malas negras contendo dezenas de milhões de dólares em notas - algumas provenientes do tráfico de armas para o Médio Oriente e ainda comprimidas pelas fitas de selagem da reserva federal norte-americana. Um clima fantástico, praias maravilhosas e um saber viver grego - além de um IRC de apenas 10%, o mais baixo da Europa - agradam a qualquer um. As afinidades religiosas, uma herança britânica de leis pragmáticas, pouca burocracia e justiça eficiente, ajudaram a compor a estranha aliança entre financeiros e advogados cipriotas e criminosos e multimilionários russófilos.

A perspetiva da adoção da moeda única (em 2008) viria a conferir adicional respeitabilidade à ilha que viu nascer Afrodite. Os russos procuravam garantias contra processos kafkianos como o que Putine montou contra Khodorkovsky, ou contra o recém-falecido Berezovsky -os multimilionários que se viraram contra o líder - e que tiveram o condão de mostrar aos oligarcas que quem manda na Rússia ainda é o KGB (não por acaso, uma das críticas moscovitas à UE refere-se ao "eurobolchevismo" da taxa sobre os depósitos). Chipre tornou-se, assim, o destino ideal para capitais da ex-URSS e, em 2005, a três anos da adesão ao euro, o número de empresas com sede no paraíso fiscal atingia 14 500 - um pulo de 70% em relação a 2002. Boa parte delas, russas, já se sabe. Durante anos, o setor financeiro não parou de crescer em Chipre, a ponto de os depósitos russos, sozinhos, serem superiores ao PIB da ilha (30 mil milhões para 23 mil milhões de dólares). 

Armas para a Síria

Mesmo com a adoção teórica de medidas destinadas a lutar contra o branqueamento de capitais, os negócios duvidosos não pararam: o nome de Chipre surgiu associado ao escândalo "Petróleo por Alimentos", operação que vigorou entre 1996 e 2003, e mediante a qual Saddam Hussein continuou a obter receitas, apesar das sanções internacionais impostas ao Iraque. A mesma coisa sucedeu com o affair Magnitsky, nome do advogado, entretanto falecido de doença e sem auxílio, numa prisão russa, que estava a investigar uma fraude fiscal de milhões de euros, envolvendo bancos de Chipre, o FSB, sucessor do KGB, o Ministério do Interior da Rússia e a máfia russa. Em 2011, Chipre surge de novo sob as luzes da ribalta por causa de negócios sujos, desta feita devido ao caso do cargueiro MS Chariot, apresado na ilha com um carregamento de 60 toneladas de armas da Rosoboronexpor, o braço de Moscovo para o fabrico de armamento, mas que as autoridades cipriotas deixaram seguir viagem com destino à Síria, apesar do embargo militar internacional ao regime de Bashar al-Assad...

Com a exportação da crise do subprime para a Europa, os bancos e instituições financeiras de Chipre, que já estavam sobredimensionados em relação à economia da ilha (com receitas sete vezes superiores ao PIB), foram ainda sobrecarregados com a falta de pagamento da dívida grega. O ex--Presidente Demetris Christofias, um comunista que se definia a si próprio como a "ovelha vermelha da Europa", tinha ótimas relações com Moscovo. Resistiu a um resgate e conseguiu aguentar o barco até às ultimas eleições, há pouco mais de um mês, com um empréstimo de Moscovo no valor de  2,5 mil milhões de euros, efetuado em 2011, por quatro anos.  Mas, em janeiro, as más notícias começaram a acumular-se: as receitas dos impostos - IVA, Imposto Automóvel, Taxas Aduaneiras - desataram a cair a pique, entre 4% e 40%, no caso dos automóveis. Globalmente, o Estado cipriota, já endividado, via o dinheiro de que dispunha baixar 2,6% num só ano. O resgate era inevitável e toda a gente o sabia. O atual Presidente, Nicos Anastasiades, foi eleito prometendo não tocar nos depósitos...  

Não perca o artigo completo na Revista VISÃO desta semana


=Visão=

Sem comentários:

Enviar um comentário