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terça-feira, 26 de março de 2013

Pompeia poderia ser uma cidade dos nossos dias


O British Museum inaugura quinta-feira a exposição Vida e Morte em Pompeia e Herculano, uma visita guiada ao quotidiano do Império Romano sepultado sob as cinzas do vulcão Vesúvio.
Um fragmento de fresco de Estilo


Uma pintura de parede retratando um casal – o marido identificado como o padeiro Terentius Neo; uma bracelete de ouro em forma de cobra; um berço de bebé em madeira carbonizada; meia dúzia de outras peças de mobiliário; relevos em mármore representando cenas da vida real e da mitologia romana... Mas também os cadáveres de uma família (os pais e duas crianças) sob as escadas de sua casa numa posição em que se adivinha o pânico pela aproximação da morte; o cadáver de uma mulher em que se vêem ainda os ossos; ou a icónica “escultura viva” de um cão contorcendo-se de dor...
Todos nós já vimos essas imagens da “morte em directo”, que uma imprevista erupção do vulcão Vesúvio gravou nos corpos dos habitantes e no chão das cidades de Pompeia e Herculano, no Sul de Itália, nesse dia trágico do Verão do ano 79 d.C. –, um quadro que depois ficaria escondido sob as cinzas e o esquecimento, até que seria redescoberto com as escavações iniciadas em meados do século XVIII, e que se vêm desenvolvendo até à actualidade. Uma perspectiva diferente dessa catástrofe é agora mostrada no Museu Britânico, em Londres, na exposição Vida e Morte em Pompeia e Herculano, que é inaugurada esta quinta-feira e poderá ser visitada até 29 de Setembro.
Ainda que as imagens da morte e do sofrimento sejam incontornáveis na exposição, o museu quis pôr a tónica na vida quotidiana de Pompeia e Herculano e, por extensão e paralelismo, nas cidades do Império Romano dessa época. “A exposição terá como foco principal um olhar sobre a casa romana e sobre as pessoas que as habitavam nessas cidades desditosas”, diz o texto de apresentação da mostra, que tem como comissário Paul Roberts, responsável pelas colecções romanas do museu londrino. “Nós sabemos que para algumas pessoas a ideia da morte será o aspecto mais desafiador da exposição”, diz o comissário, assinalando, no entanto, a preocupação de abordar essa vertente com um grande respeito. “Trata-se de pessoas que foram reais”, e esta exposição só existe “porque elas morreram”, realça Paul Roberts.
Vida e Morte em Pompeia e Herculano é a primeira grande exposição que o museu dedica à tragédia do Vesúvio no golfo de Nápoles, e a grande exposição de teor arqueológico dos últimos 40 anos em Londres, depois da que foi dedicada, em 1972, ao túmulo de Tutankhamon. Curiosamente, este tema justifica actualmente duas outras exposições espalhadas pelo mundo:Pompeia, Catástrofe sob o Vesúvio, no Centro Arte Canal, em Madrid (até 5 de Maio); e Os Últimos Dias de Pompeia: Decadência, Apocalipse, Ressurreição, no Museu de Arte de Cleveland, nos Estados Unidos (até 19 de Maio).


A exposição em Londres reúne 250 artefactos que foram cedidos, “de forma extremamente generosa”, pelos responsáveis pelos Centros Arqueológicos de Nápoles e de Pompeia e de outras instituições italianas, salientou ao jornal The Guardian o director do museu, Neil MacGregor, que apresentou a exposição como a maior do programa do museu para 2013.
A mostra surge pouco mais de dois anos após uma sucessão de desabamentos em Pompeia motivados pelo mau tempo de Dezembro de 2010, que puseram em risco este sítio classificado pela UNESCO como Património da Humanidade, e deram origem a muitas críticas à política do património do Governo então liderado por Silvio Berlusconi. No passado mês de Fevereiro, a Justiça italiana abriu mesmo uma investigação acusando os responsáveis por aquela zona arqueológica de má gestão de fundos.
“Este evento majestoso permitirá – espera-se – lembrar ao mundo que Pompeia não é uma atracção turística que se deva tratar com negligência, mas antes o mais revelador memorial do passado da humanidade”, escreve sobre a exposição Jonathan Jones no The Guardian. O crítico de arte acrescenta: “A razão por que Pompeia e Herculano nos fascinam não é tanto pela preservação de todo um mundo no momento da sua extinção maciça, mas a forma misteriosa como esse mundo nos reflecte a nós próprios”.
De facto, o alinhamento de objectos, artefactos e testemunhos que fazem a exposição documenta aquilo que era a vida quotidiana no Império Romano nesses anos de apogeu, quando o imperador Tito Flávio – o mesmo que inaugurou o Coliseu de Roma – governava um vasto território que ia desde o Egipto até às lhas Britânicas.
Pompeia e Herculano eram à data da tragédia do Vesúvio duas terras florescentes na região da Campânia. “Entre uma combinação de escravatura e engenharia hidráulica, os romanos livres viviam como nós, no nosso tempo, rodeados de bens de consumo e conforto engenhoso”, descreve Jonathan Jones, a realçar o carácter inesperadamente didáctico da exposição. Ou seja, eram duas cidades normais, subitamente vitimadas por um acontecimento extraordinário.
Dentro dessa normalidade, estava também a realidade do sexo, tendo sido descobertos testemunhos e referências a várias dezenas de bordéis – um deles, preservado intacto, foi descoberto nas escavações de 1752, na Vila dos Papiros de Herculano, tendo depois sido trasladado para o Museu Arqueológico de Nápoles, onde só seria aberto ao público no ano... 2000.
Uma estátua do deus Pan tendo relações sexuais com uma cabra, ou uma pintura mostrando um homem e uma mulher experimentando uma nova posição sexual, enquanto um escravo espera à porta, são dois exemplos de representações da vida sexual na exposição, que Jonathan Jones descreve como “um encontro com uma sociedade miraculosamente imperfeira e fascinante, com sexo e morte, com o épico humano que era Roma”.

=Público=


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