Dez anos
depois do início da guerra que iria derrubar Saddam Hussein, o Iraque enfrenta
enormes desafios e incógnitas.
Iraque está longe de ser um país pacífico
Há dez anos, na véspera da invasão americana do Iraque, a
percepção que os americanos tinham sobre a guerra que se avizinhava, alimentada
pela retórica da Casa Branca de George W. Bush, revelou-se totalmente errada. E
o custo da guerra – tanto em vidas como em dólares – rapidamente ultrapassou o
esperado. Hoje, um novo conjunto de ideias define muitas das discussões sobre a
guerra e o seu rescaldo. Serão elas igualmente erradas?
1: O reforço de tropas foi bem-sucedido
O envio de 27 mil soldados para Bagdad em 2007 tinha dois objectivos: parar a sangrenta guerra sectária e forjar um compromisso político entre os três principais grupos da sociedade iraquiana – árabes sunitas e xiitas e a etnia curda – capaz de colocar o país no caminho da estabilidade.
O envio de 27 mil soldados para Bagdad em 2007 tinha dois objectivos: parar a sangrenta guerra sectária e forjar um compromisso político entre os três principais grupos da sociedade iraquiana – árabes sunitas e xiitas e a etnia curda – capaz de colocar o país no caminho da estabilidade.
O
reforço ajudou a cumprir o primeiro objectivo, mas não foi a única razão para a
diminuição da violência. A decisão dos líderes tribais sunitas de combaterem os
rebeldes da Al-Qaeda no Iraque também teve um grande impacto. Mas também o
comportamento dos iraquianos: à medida que os bairros xiitas e sunitas de
Bagdad se tornaram mais homogéneos e unificados, as oportunidades de violência
sectária também diminuíram.
Mas
quando se tratou de fomentar o consenso político, o reforço de tropas foi um
fracasso. A maioria dos xiitas não queria dar aos sunitas e aos curdos uma
participação maior no Governo e nas forças de segurança e as esperanças de que
um grande acordo fosse anunciado nos últimos dias da Administração Bush saíram
goradas. Como consequência, continua a arder o rastilho no barril de pólvora
que é o Iraque. As disputas sobre o território e o petróleo podem desencadear
outra guerra entre árabes e curdos no Norte. Os sunitas na região centro do
país, onde há três meses se repetem protestos contra o Governo, falam
abertamente numa rebelião. Os líderes sunitas acusam as forças de segurança,
dominadas pela maioria xiita, de os perseguirem em nome do combate ao
terrorismo e de purgar o país dos membros do antigo partido Baas de Saddam
Hussein.
2: O Iraque de hoje é relativamente pacífico
Os níveis de violência estão certamente mais baixos do que em 2006, no auge da guerra civil, quando centenas de pessoas eram mortas todos os dias. Mas o Iraque está longe de ser um país estável. Na segunda-feira passada, um bombista suicida embateu com um carro cheio de explosivos contra uma esquadra da polícia, matando cinco pessoas; no mesmo dia outras seis pessoas morreram em vários ataques em Bagdad. Três dias antes, 19 pessoas morreram numa vaga de ataques contra as forças de segurança. [Nesta terça-feira, dia 19, vários atentados coordenados para assinalar o décimo aniversário do início da guerra provocaram mais de 50 mortos.]
Os níveis de violência estão certamente mais baixos do que em 2006, no auge da guerra civil, quando centenas de pessoas eram mortas todos os dias. Mas o Iraque está longe de ser um país estável. Na segunda-feira passada, um bombista suicida embateu com um carro cheio de explosivos contra uma esquadra da polícia, matando cinco pessoas; no mesmo dia outras seis pessoas morreram em vários ataques em Bagdad. Três dias antes, 19 pessoas morreram numa vaga de ataques contra as forças de segurança. [Nesta terça-feira, dia 19, vários atentados coordenados para assinalar o décimo aniversário do início da guerra provocaram mais de 50 mortos.]
Para
os iraquianos, que não têm escolha, a vida ainda é definida pela violência e o
medo. “A guerra não acabou”, escreveu-me recentemente um amigo em Bagdad.
“Ainda há mortes e atentados. Ainda continuamos com medo.”
3: O Iraque é uma democracia
E é – no papel. O país realizou sucessivas eleições nacionais, tem um Parlamento e um sistema judicial minimamente funcional. Na prática, contudo, o primeiro-ministro Nuri al-Maliki é quem exerce a autoridade e está a centralizar poderes de uma forma que faz muito iraquianos lembrarem-se de Saddam. Os seus serviços de segurança detiveram vários líderes sunitas nos últimos meses, acusando-os de apoiarem a rebelião. Os responsáveis sunitas acusam Maliki de usar o terrorismo como pretexto para neutralizar os adversários políticos.
E é – no papel. O país realizou sucessivas eleições nacionais, tem um Parlamento e um sistema judicial minimamente funcional. Na prática, contudo, o primeiro-ministro Nuri al-Maliki é quem exerce a autoridade e está a centralizar poderes de uma forma que faz muito iraquianos lembrarem-se de Saddam. Os seus serviços de segurança detiveram vários líderes sunitas nos últimos meses, acusando-os de apoiarem a rebelião. Os responsáveis sunitas acusam Maliki de usar o terrorismo como pretexto para neutralizar os adversários políticos.
Desde
que foi pela primeira vez eleito, em 2006, Maliki tem vindo a consolidar o
controlo das forças de segurança iraquianas. Também foi responsável pelo
desmantelamento da milícia tribal sunita Filhos do Iraque que foi decisiva na
luta contra a Al-Qaeda. A milícia era apoiada pelos militares americanos, que
pediram a Maliki que integrasse os seus membros no Exército e na polícia.
Apesar de o ter prometido, apenas uma pequena fracção dos milicianos foi integrada.
4: O Irão domina o Iraque
Esqueçam tudo o que os EUA deram, em sangue e dinheiro, ao Iraque. O Irão é o aliado mais estratégico do Iraque. Maliki deve o seu segundo mandato à pressão que Teerão exerceu sobre os partidos xiitas rivais do primeiro-ministro, muitos dos quais recebem um apoio financeiro substancial do governo iraniano. E há muitas provas desta ligação: apesar das objecções de Washington, o Governo de Maliki permitiu que aviões de carga iranianos, alegadamente carregados de munições, voassem para a Síria através do espaço aéreo iraquiano, o que permite a Teerão continuar a apoiar Bashar al-Assad.
Esqueçam tudo o que os EUA deram, em sangue e dinheiro, ao Iraque. O Irão é o aliado mais estratégico do Iraque. Maliki deve o seu segundo mandato à pressão que Teerão exerceu sobre os partidos xiitas rivais do primeiro-ministro, muitos dos quais recebem um apoio financeiro substancial do governo iraniano. E há muitas provas desta ligação: apesar das objecções de Washington, o Governo de Maliki permitiu que aviões de carga iranianos, alegadamente carregados de munições, voassem para a Síria através do espaço aéreo iraquiano, o que permite a Teerão continuar a apoiar Bashar al-Assad.
Seria,
no entanto, errado assumir que Maliki autoriza estes voos unicamente por causa
da pressão iraniana. Apesar de Assad perfilhar muita da ideologia do partido
Baas de Saddam, ele pertence à minoria alauita, um ramo do xiismo. Mas não é
apenas este parentesco que leva Maliki a apoiar o status
quo na Síria. Ele e
outros dirigentes xiitas iraquianos temem que se o Exército Livre da Síria
derrubar Assad, os rebeldes formem um governo radical sunita que colabore com a
minoria sunita do Iraque para atacar o Governo de Bagdad. “Se a oposição sair
vitoriosa, haverá uma guerra civil no Líbano, divisões na Jordânia e uma guerra
sectária no Iraque”, avisou Maliki numa entrevista à AP no início deste mês.
Mas
nem o dinheiro de Teerão nem a proximidade garantem que os iraquianos xiitas
farão a sua parte. Basta pensar em Moqtada al-Sadr, líder do Exército de Mahdi,
a milícia que se tornou a besta negra das tropas americanas durante parte da
guerra. Ele viveu durante anos no Irão, ganhando lá as suas credenciais
religiosas e reconstruindo o seu movimento político. Mas desde o seu regresso
ao Iraque, tem-se assumido mais como um líder nacionalista, aproximando-se das
facções curdas e sunitas que rivalizam com Maliki. No final do ano passado,
quando os sunitas organizaram grandes protestos exigindo que Maliki alterasse
as leis de terrorismo e de desbaasificação, Sadr rejeitou as directivas de
Teerão e encontrou-se com dirigentes sunitas, negociando compromissos
políticos.
O
Irão continua a ser maior e mais poderoso. Mas a colaboração iraquiana com
Teerão é tão ditada pelos seus próprios interesses como pelos interesses do
país vizinho.
5: Os americanos deixaram o Iraque.
Ainda há cerca de 220 militares dos EUA no Iraque. Estão a trabalhar para o Gabinete de Cooperação de Segurança, que gere a venda de equipamento militar ao país e coordena acções de treino. Os militares vivem num anexo à embaixada dos EUA no centro de Bagdad, a maior missão diplomática americana em todo o mundo. O gigantesco complexo, construído dentro da antiga Zona Verde da capital, alberga centenas de funcionários do Departamento de Estado, especialistas americanos em desenvolvimento e representantes de outras agências federais. Legiões de seguranças privados vigiam o complexo.
Ainda há cerca de 220 militares dos EUA no Iraque. Estão a trabalhar para o Gabinete de Cooperação de Segurança, que gere a venda de equipamento militar ao país e coordena acções de treino. Os militares vivem num anexo à embaixada dos EUA no centro de Bagdad, a maior missão diplomática americana em todo o mundo. O gigantesco complexo, construído dentro da antiga Zona Verde da capital, alberga centenas de funcionários do Departamento de Estado, especialistas americanos em desenvolvimento e representantes de outras agências federais. Legiões de seguranças privados vigiam o complexo.
O
receio de que a guerra na Síria alastre ao Iraque levou recentemente a CIA a
aumentar o seu apoio às forças de contraterrorismo iraquianas, segundo um
relatório divulgado pelo The Wall Street Journal.
Apesar de a agência manter os planos para reduzir a sua presença no Iraque a
300 funcionários, a sua delegação em Bagdad continua a ser a maior em todo o
mundo.
Rajiv Chandrasekaran é redactor principal do Washington Post e autor dos livros Little America: The War Within the
War for Afghanistan e Imperial Life in the Emeral City:
Inside Iraq’s Green Zone (Green Zone – A Vida Imperial na Cidade Esmeralda, Edições
70)
Exclusivo PÚBLICO/The Washington Post
Notícia corrigida às 9h45. São 220 militares americanos que
permanecem no Iraque e não 220 mil.
=Público=
PS: Que lucrou o mundo e a democracia com a
invasão e guerra do e no Iraque?
Terá valido apenas para que o mundo ficasse a
conhecer quatro rotundos mentirosos, que um deles afirmou publicamente, entre
nós, ter visto as provas da posse de armas de destruição maciva na posse de
Saddam Husein, após a cimeira nos Açores.
Era preciso que o filho dese sumiço ao
iniciado pelo pai.
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