No Brasil,
é aquele sujeito que se sente no direito de ir contra as ideias mais
progressistas e civilizadas possíveis em nome de uma pretensa independência de
opinião. Saiba como reconhecê-lo.
Em 1996, três jornalistas –
entre eles o filho do Nobel de Literatura Mário Vargas Llosa, Álvaro – lançaram
com estardalhaço o Manual do
perfeito idiota latino-americano. Com suas críticas às ideias de esquerda,
o livro se tornaria uma espécie de bíblia do pensamento conservador no
continente. Vivia-se o auge do deus mercado e a obra tinha como alvo o
pensamento de esquerda, o protecionismo econômico e a crença no Estado como
agente da justiça social. Quinze anos e duas crises econômicas mundiais depois,
vemos quem de fato era o perfeito idiota.
Mas, quem diria, apesar de derrotado pela história, o Manual continua sendo não só a única
referência intelectual do conservadorismo latino-americano como gerou filhos.
No Brasil, é aquele sujeito que se sente no direito de ir contra as ideias mais
progressistas e civilizadas possíveis em nome de uma pretensa independência de
opinião que, no fundo, disfarça sua real ideologia e as lacunas em sua
formação. Como de fato a obra de Álvaro e companhia marcou época, até como
homenagem vamos chamá-los de “perfeitos imbecis politicamente incorretos”. Eles
se dividem em três grupos:
1. O
“pensador” imbecil politicamente incorreto: ataca líderes LGBTs (lésbicas,
gays, bissexuais e transgêneros) e defende homofóbicos sob o pretexto de
salvaguardar a liberdade de expressão. Ataca a política de cotas baseado na
ideia que propaga de que não existe racismo no Brasil. Além disso, ações
afirmativas seriam “privilégios” que não condizem com uma sociedade em que há
“oportunidades iguais para todos”. Defende as posições da Igreja Católica
contra a legalização do aborto e ignora as denúncias de pedofilia entre o
clero. Adora chamar socialistas de “anacrônicos” e os guerrilheiros que lutaram
contra a ditadura de “terroristas”, mas apoia golpes de estado
“constitucionais”. Um torturado? “Apenas um idiota que se deixou apanhar.” Foge
do debate de ideias como o diabo da cruz, optando por ridicularizar os adversários
com apelidos tolos. Seu mote favorito é o combate à corrupção, mas os corruptos
sempre estão do lado oposto ao seu. Prega o voto nulo para ocultar seu
direitismo atávico. Em vez de se ocupar em escrever livros elogiando os
próprios ídolos, prefere a fórmula dos guias que detonam os ídolos alheios – os
de esquerda, claro. Sua principal característica é confundir inteligência com
escrever e falar corretamente o português.
2. O
comediante imbecil politicamente incorreto: sua visão de humor é a do bullying. Para ele não existe o
humor físico de um Charles Chaplin ou Buster Keaton, ou o humornon sense do Monty Python: o único humor
possível é o que ri do próximo. Por “próximo”, leia-se pobres, negros, feios,
gays, desdentados, gordos, deficientes mentais, tudo em nome da “liberdade de
fazer rir”. Prega que não há limites para o humor, mas é uma falácia. O limite
para este tipo de comediante é o bolso: só é admoestado pelos empregadores
quando incomoda quem tem dinheiro e pode processá-los. Não é à toa que seus
personagens sempre estão no ônibus ou no metrô, nunca num 4×4. Ri do office-boy
e da doméstica, jamais do patrão. Iguala a classe política por baixo e não tem
nenhum respeito pelas instituições: o Congresso? “Melhor seria atear fogo”.
Diz-se defensor da democracia, mas adora repetir a “piada” de que sente
saudades da ditadura. Sua principal característica é não ser engraçado.
3. O
cidadão imbecil politicamente incorreto: não se sabe se é a causa ou o
resultado dos dois anteriores, mas é, sem dúvida, o que dá mais tristeza entre
os três. Sua visão de mundo pode ser resumida na frase “primeiro eu”. Não lhe
importa a desigualdade social desde que ele esteja bem. O pobre para o cidadão
imbecil é, antes de tudo, um incompetente. Portanto, que mal haveria em rir
dele? Com a mulher e o negro é a mesma coisa: quem ganha menos é porque não fez
por merecer. Gordos e feios, então, era melhor que nem existissem. Hahaha.
Considera normal contar piadas racistas, principalmente diante de “amigos”
negros, e fazer gozação com os subordinados, porque, afinal, é tudo
brincadeira. É radicalmente contra o Bolsa Família porque estimula uma
“preguiça” que, segundo ele, todo pobre (sobretudo se for nordestino) possui
correndo em seu sangue. Também é contrário a qualquer tipo de ação afirmativa:
se a pessoa não conseguiu chegar lá, problema dela, não é ele que tem de “pagar
o prejuízo”. Sua principal característica é não possuir ideias além das que
propagam os “pensadores” e os comediantes imbecis politicamente incorretos.
A. G.
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