Na parte final da matéria
assinada pelo jornalista Osvaldo Bertolino, lê-se: "Que ninguém se
iluda: a noção de que pagar impostos é uma obrigação de todo mundo e não
apenas de um punhado terá terá de ser arrancada a fórceps".
Está aqui uma boa
parte da explicação-resposta para as costumeiras mensagens que recebemos,
clamando contra os elevados impostos brasileiros. O raciocínio é simples:
se apenas poucos pagam impostos, terão eles de pagar muito. É bom também
não esquecer que quem concede liminares aos sonegadores, e senta em cima dos
processos de sonegação fiscal não é o Executivo...
Em maior grau em
países como o Brasil, mas igualmente sugadora de recursos financeiros em todas
as nações do mundo, a
evasão fiscal é, de há muito, uma preocupação planetária.
Sob o título de
"O sigilo bancário no banco dos réus", a CartaCapital traz reportagem de Gianni Carta,
às páginas 56/7, que nos oferece mais informações sobre a questão da sonegação
fiscal, dos paraísos fiscais, lavagem de dinheiro, e até sobre o aumento
da participação dos mais ricos dos EUA na riqueza daquele país "a partir
da crise de 2007".
Alguns trechos da
cobertura jornalística:
"A renúncia do ministro francês Cahuzac, dono de
uma conta na Suíça, precipita o debate sobre o fim dos paraísos fiscais na UE.
Mas a Áustria resiste.
(...)
Na última década, houve dois principais casos a mobilizar
autoridades europeias, na luta contra a evasão fiscal e, por tabela, contra o
sigilo bancário e os paraísos fiscais. O primeiro caso remonta a 2009,
quando procuradores de Miami pediram ao banco privado suíço UBS a divulgação
dos nomes de seus clientes norte-americanos suspeitos por evasão fiscal.
(...)
O segundo evento foi,
precisamente, a demissão de Chuzac por fraude fiscal, somada às revelações dos
Offshore Leaks, vazamentos compilados pelo Consórcio Internacional de
Jornalistas de Investigação (Icij).
(...)
Por fim, as autoridades europeias foram sacudidas por uma nova
lei norte-americana batizada de Foreign Account Compliance Act (Facta), [a entrar] em vigor a partir de 1º de
janeiro de 2014. Em miúdos, a lei obrigará a todas as instituições
financeiras globais, sem exceção, a colaborar com o fisco dos EUA".
Neste ponto,
interrompemos Gianni Carta chamar a atenção para a investida do imperialismo
que, à primeira vista, através de uma lei embasada no princípio ético de
combate à evasão fiscal, procura forçar os países do mundo inteiro a dobrar-se
a uma decisão intervencionista, a qual, se perdurar, abrirá um precedente de
consequências previsíveis. Exceto se as punições aos bancos
"infratores" ficarem circunscritas ao território norte-americano.
Somos a favor de uma
pressão internacional, via uma ONU independente, para a completa extinção dos
paraísos fiscais.
"(...)
Diga-se que o
Conselho Europeu não dispõe de uma definição precisa para 'paraísos fiscais'.
(...) Segundo a ONG [britânica Tax Justice Network], o Grão-Ducado de Luxemburgo é o
terceiro paraíso fiscal do mundo, precedido pela Suíça
(...)
Como diz Eric Walravens, do site francês Mediapart, a
evasão fiscal 'está com os dias contados'. Segundo
Walravens, os EUA podem ser uma 'potência em declínio', mas
mas desta feita o'imperialismo norte-americano', com seu poder
persuasivo unilateral, parece estar prestes a conseguir atingir uma meta
positiva[claro, desde que
respeite a soberania das outras nações].
É de grande
importância o fato de o premier luxemburguês, Jean-Claude Juncker, ter, debaixo
da pressão dos norte-americanos, aceito a troca automática de informações de
cidadãos europeus [?] a partir de 2015.
As reações na UE parecem estar em plena sintonia com os planos de
Washington. Herman van Rompuy, presidente do Conselho Europeu, disse:
'Precisamos aproveitar o momento político'. Na
próxima reunião dos 27 ministros de Finanças da UE, dia 22 de maio próximo,
serão debatidas as medidas para evitar a evasão fiscal. A importância
envolvida está muito longe de ser irrisória. Equivale a 1 trilhão de
euros somente na UE, ou a metade do PIB da França.
No novo contexto, os países terão de se tronar mais
transparentes por meio da troca de informações e terão até de abolir leis.
(...)
Paraísos fiscais terão de reinventar suas
economias. O objetivo dos governos da Confederação Helvética [leia-se, Suíça] nunca
foi somente o de salvar este ou aquele banco. Fundamental era manter
ileso o segredo bancário, até agora motor da economia do país.
Em entrevista ao semanário francês Le Journal du Dimanche, o economista Paul Jorion
diz que o plano de resgate de Chipre definido pela Troika (Fundo Monetário
Internacional, Banco Central Europeu e Comissão Europeia) foi a gota-d'água.
Contas de cidadãos foram, enfim, congeladas. Em tempos de crise, o
nível de tolerância é necessariamente baixo.
Atualmente, os
europeus pagam impostos mais elevados, os seus salários foram reduzidos e o
poder de compra está em queda livre. Tudo isso em nome da
competitividade.
Enquanto isso, os ricos, ao contrário daqueles da crise de
1929, lembra Jorion, ficaram, a partir da crise de 2007, mais ricos.
Em 2000, 1% dos norte-americanos detinha 32,8% da riqueza nacional
- hoje, po percentual subiu para 40%.
O mesmo acontece na França. Cahuzac é o exemplo de alguém
que em tempos de crise deveria contribuir com somas mais elevadas que os menos
endinheirados. François Hollande enfrenta uma crise moral. Por
essas e outras, ele exigiu que seus 38 ministros revelassem, na segunda-feira 15,
seu patrimônio. Descobriram-se ministros milionários e outros menos
endinheirados.
(...)
Enquanto isso, Angela Merkel, a chanceler alemã, está, às
vésperas de eleições no seu país, na liderança do movimento para colocar um fim
nos paraísos fiscais.
(...)
Na semana passada ela esteve no Reino Unido e,
ao lado do premier conservador David Cameron, reforçou o fato de que os
paraísos fiscais nas Ilhas Britânicas devem ser monitorados. Cameron
concordou. Maria Fekter, ministra austríaca das Finanças, discorda.
'A Áustria manterá seu segredo bancário', martela a
ministra. Para ela, bancos que entregam informações de seus clientes 'fazem uma invasão massiva em suas
vidas privadas'. Em plena campanha eleitoral, Viena será o maior
entrave para o projeto de uma UE transparente. E como se comportarão
outros paraísos fiscais fora do território da UE, entre eles, Andorra,
Liechtenstein e Mônaco?
M. N. C.
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